Nova ordem para o futebol (artigo)

Nova ordem para o futebol (artigo) Por Fernando Schmidt*

Os últimos acontecimentos que abalaram os alicerces do futebol mundial mostram que o Brasil deve mesmo instituir – agora mais do que nunca – o exemplo da Fédération Internationale de Football Association.

A começar pela renúncia do atual presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, repetindo o gesto já anunciado por Joseph Blatter.

A propósito, o envolvimento de Blatter e seus parceiros brasileiros em negócios escusos já havia sido apontado há muito pelo jornalista inglês Andrew Jennings. Em Jogo Sujo e Um Jogo Cada Vez Mais Sujo, duas de suas importantes obras para se compreender os bastidores nada glamurosos da FIFA e do futebol, Jennnings já apontava, desde 2006, as maracutaias de Blatter, Teixeira, Marin, Hawilla, Blazer, Warner, Leoz, Grondona, Hayatou e Valcke.

O desmonte completo dessa máquina que se locupletou do futebol, e o desmoralizou, tem que chegar no Brasil às federações estaduais, onde prevalece – assim como na CBF - o futebol construído sobre a falta de transparência, a ganância e a irresponsabilidade fiscal, protegido há décadas por um então inexpugnável escudo político-júridico.

O esquema até então usado por Blatter para lhe dar sustentação na Federação Internacional, irrigando com dinheiro as 209 federações e associações nacionais de futebol, é o mesmo utilizado continuadamente por João Havelange, Ricardo Teixeira, José Maria Marin, e agora Marco Polo Del Nero, para garantir a hereditariedade na capitania em que se transformou a CBF.

E essa reformulação do futebol brasileiro terá que ser ampla, geral e irrestrita, já que todo o modelo de sustentação da CBF segue também o padrão FIFA de fazer negócios – ou negociatas: milhões de reais em jogo, milhões de aficcionados atingidos, e apenas um punhado de beneficiários diretos.

O primeiro passo para essa mudança é a discussão e aprovação pelo Congresso Nacional da MP do Proforte, a lei de responsabilidade fiscal do esporte brasileiro. A renegociação de mais de R$ 3,3 bilhões da dívida dos clubes com a União é fundamental, mas muito mais importante é que os dirigentes possam obedecer a parâmetros legais de gestão financeira e responsabilidade fiscal.

Apesar de ser entidade privada, a Confederação Brasileira de Futebol tem que ser fiscalizada, porque lida com um esporte público, popular, e inclusive se envolve, direta ou indiretamente, com dinheiro oriundo dos cofres públicos.

O remédio para acabar com as negociatas, manipulação de resultados, eleições farsescas e propinas? Transparência, maior participação nas decisões, limitação do número de mandatos, fim da impunidade. Maus gestores do futebol têm que se responsabilizar com o seu patrimônio pessoal pelos danos causados.

Enfim, democracia, muita democracia.

E muito me orgulha dizer que o nosso Esporte Clube Bahia, em uma epopéia que durou 25 anos, foi o primeiro clube do Brasil, por vontade do seu torcedor, a romper com essas amarras, quebrando os laços com um futebol de natureza autoritária, mas desprovido de qualquer autoridade moral.

Os clubes brasileiros de futebol têm a oportunidade, neste instante, de retomarem a pauta do jogo limpo e do bom senso e da formação de jovens atletas com alta qualificação, criando uma liga independente, sem o jugo da CBF e desatrelada do feudalismo - que seria burlesco se não fosse trágico - das federações estaduais.

Para o bem do esporte, este é o grande momento para que o futebol brasileiro se livre, de uma vez por todas, dos traficantes da bola e dos gestores irresponsáveis.

FERNANDO SCHMIDT, advogado, é ex-presidente do Esporte Clube Bahia.
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