As imagens desfilam aleatoriamente. Lado a lado com o senador Teotônio Vilela (1917-1983), a Mãe Nicinha do Bogum (1911-1994) e a lendária Mulher de Roxo (data de nascimento imprecisa, falecida em abril de 1997) contemplam o primeiro incêndio do atual prédio do Mercado Modelo, em 1994. Claro que esta cena hipotética é um mero exercício de imaginação. Afinal, por uma questão cronológica, os personagens mencionados não poderiam estar no local do sinistro que destruiu o histórico prédio do cartão-postal de Salvador.
Mas há, sim, um espaço em que essa diversidade de registros pode se encontrar: a exposição “Ginga Nagô”, mostra fotográfica do mestre Anízio Carvalho, 93 anos, referência de várias gerações de jornalistas. Promovida pela Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e sob a curadoria do premiado fotógrafo Manu Dias, a exposição será aberta na próxima quarta-feira (19), às 10h, no Museu de Imprensa, no Centro Histórico de Salvador. A entrada é gratuita.
Às vésperas de completar um centenário de vida – nasceu em 23 de fevereiro de 1930, em Conceição da Feira, interior da Bahia – Anízio enfrenta alguns problemas de saúde associados à idade, mas se mantém lúcido e com uma memória invejável. Melhor do que muito novinho e muita novinha por aí. Ele identifica cada um dos momentos eternizados com suas máquinas preferidas – a Rolleiflex, equipamento doado pelo mestre Leão Rosenberg, e a Speed Graphic, adquirida com muita dificuldade em suaves prestações. Identifica personagem retratado, local e circunstâncias da foto. E é cada história!
O tempo, no entanto, é inclemente. E as condições de acondicionamento do acervo não são exatamente as ideais. Para evitar que esse material se perca, a ABI e a família do decano estudam formas de garantir a preservação das imagens por meio de uma curadoria de conteúdo. A exposição é apenas o primeiro passo desse projeto.
Empenhado pessoalmente na construção da “Ginga Nagô”, o presidente da ABI, Ernesto Marques, traduz a importância da mostra como um incentivo para que instituições culturais atuem na preservação do acervo reunido pelo fotojornalista em quase seis décadas de atuação plena como repórter fotográfico. “Ele teve a oportunidade de testemunhar fatos que entraram para a história e foram registrados por suas lentes. Foi um dos poucos que tiveram a sabedoria de guardar os negativos, que são verdadeiras relíquias para a memória do estado”, salienta o O curador Manu Dias vê em Anízio “um exemplo da garra que o jornalista de imagem tem que ter para superar as adversidades e, com criatividade, sempre conseguir levar a foto para a redação”. E destaca as contribuições do colega para o fotojornalismo: “Testemunha viva da Bahia boêmia, atravessou a ditadura e as rusgas políticas, com muita ginga, malemolência e a astúcia dos grandes jornalistas que sabem chegar”, elogia.
Manu Dias leva para a mostra imagens de grandes artistas de uma época áurea da Bahia, o encontro de Anízio com o candomblé, flagras da vida política, manifestações culturais e o drama do incêndio da Feira de Água de Meninos, entre outras. Bastante animado com a exposição, Anízio se diz “feliz e orgulhoso” e não contém a ansiedade. A família confirma: ele conta os dias para a abertura da mostra, que vai chancelar seus quase 60 anos de vida profissional.
SERVIÇO
Data: 19 de abrilHora: 10h
Local: Museu de Imprensa da ABI (Térreo do Edifício Ranulfo Oliveira – Rua Guedes de Brito, 1 – Praça da Sé, Salvador)
Entrada gratuita